Sem alarde e sem convocar a imprensa, o governo brasileiro divulgou recentemente sua nova meta climática para a próxima década por meio de um breve comunicado, sem cerimônia oficial. A expectativa era alta para o anúncio antes do início da COP29, em Baku, Azerbaijão, mas a forma discreta da divulgação e a ausência de detalhes indicam possíveis divergências internas entre ministérios.
Segundo o comunicado, o Brasil se compromete a reduzir suas emissões de gases de efeito estufa entre 59% e 67% até 2035, tomando como base os níveis de 2005. Na prática, isso significaria manter as emissões anuais entre 850 milhões e 1,05 bilhão de toneladas de dióxido de carbono equivalente (tCO2e), adotando um sistema incomum de “bandas” para a meta.
Como esses resultados serão alcançados ainda é um mistério, já que o governo não divulgou um plano detalhado. Espera-se que o vice-presidente Geraldo Alckmin, líder da delegação brasileira na COP29, forneça mais informações.
Especialistas e grupos socioambientais receberam a notícia com decepção, principalmente porque o Brasil será anfitrião da COP30, que terá como foco principal as Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) — as metas de cada país para enfrentar as mudanças climáticas. Além disso, a expectativa de liderança brasileira na agenda climática aumenta frente ao negacionismo climático internacional.
O governo afirma que a nova meta está “alinhada ao Acordo de Paris, que busca limitar o aquecimento global a 1,5°C acima dos níveis pré-industriais”, e que visa avançar para a neutralidade climática até 2050. No entanto, especialistas discordam. Segundo o painel do IPCC, para manter a temperatura dentro desse limite, as emissões globais precisariam cair 60% até 2035 em relação a 2019.
Com base nisso, as emissões brasileiras em 2035 deveriam estar abaixo de 680 milhões de tCO2e — bem menos que o limite inferior da nova meta divulgada. Além disso, a promessa do presidente Lula de desmatamento zero até 2030, a meta de recuperação de 12 milhões de hectares de florestas (Planaveg) e o compromisso de reduzir metano indicam que o país deveria mirar emissões inferiores a 650 milhões de tCO2e para 2035.
Marcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima, criticou a falta de transparência no comunicado, apontando a ausência de informações essenciais para avaliar a ambição real da nova NDC brasileira. Ele questiona: “Como será tratado o desmatamento? Qual será o papel dos combustíveis fósseis? Quais setores da economia contribuirão para as metas?”
Enquanto reconhece o esforço do Ministério do Meio Ambiente sob liderança de Marina Silva, o cenário revela uma tensão política, especialmente com setores do governo que pressionam para flexibilizar as regras, favorecendo o agronegócio — um dos principais resistores aos cortes nas emissões.
Texto adaptado com base em análise e comunicados recentes de fontes socioambientais e especialistas brasileiros.