ECONOMIA VERDE
20 de outubro de
2020 | Governo do Estado de Rondônia
A Secretaria Estadual do Desenvolvimento Ambiental (Sedam) solicitou a
realização do inventário de árvores, cipós, arbustos e flores da Reserva
Extrativista do Rio Cautário. Ele revelará, em equações matemáticas, o volume
de carbono existente nas árvores.
Duas décadas depois dos primeiros estudos a respeito das ocupações de
espaços na floresta rondoniense que veio ser essa Resex, a floresta em pé dá
lugar ao maior projeto de crédito de carbono em área extrativista no País.
A Resex tem partes nos municípios de Costa Marques e Guajará-Mirim,
ambos na fronteira brasileira com a Bolívia. É uma rica fonte para
extrativistas e para a Universidade Federal de Rondônia (Unir) pesquisar
árvores e plantas medicinais.
O serviço de medição e identificação de espécies durou 30 dias, foi
concluído duas semanas atrás, e vai contemplar 95 famílias de sete comunidades:
Águas Claras, Canindé, Ilha/Jatobá, Lago Verde, Laranjal, Ouro Fino, e Vitória
Régia.
A equipe do inventário, em laboratório de manejo florestal envolveu 18
pessoas – pesquisadores e acadêmicos de diversas áreas alunos de pós-graduação
na Unir e técnicos de nível médio. Eles trabalharam em parcelas de 70 x 70
metros, usando trenas e fitas diométricas, e para caminhar dentro da floresta
também usaram imagens de satélite.
O pouso de abelhas em botas e nas calças dos integrantes da equipe
sinalizou um ambiente rico em flores nativas.
Presença de abelhas na floresta é bom sinal, constata a equipe responsável pela identificação de plantas e medição das árvores |
O secretário estadual do Desenvolvimento Ambiental, Marcílio Lopes
enfatizou “o sentimento de conservação” dos moradores das sete comunidades.
“Alguns deles acompanharam a equipe floresta adentro, constatando a imensa
riqueza disponível para a sua autossustentabilidade”.
Com o inventário, a Sedam demonstra que mudanças climáticas globais,
fotossíntese e estudo da biomassa florestal estão fortemente ligados. E o elo
que conecta esses temas é o carbono, atualmente um dos assuntos mais
debatidos no meio científico e ambiental, pois o mundo inteiro está preocupado
com as emissões e estoques.
“O inventário em parcelas mede tudo o que tem aqui
dentro, e a gente obtém resultados que nos dão ideia da estrutura da floresta,
dos solos, do volume de madeira caída e de carbono florestal”, explicou
o coordenador da equipe, engenheiro florestal Francisco Higuchi.
A equipe mediu com fita métrica árvores acima de 10 cm de diâmetro, a
1,30 m da base. Aquelas com troncos diferentes foram medidas mais acima ainda.
Ao mesmo tempo, colocou plaquinhas de alumínio indicando a medição.
O extrativista Felipe Lopes, um dos 18 membros da equipe, disse que o
trabalho de um mês apresentou resultado positivo e previu: “Dentro de dois
anos, nós moradores estaremos capacitados para saber exatamente como fazer as
próximas medições”.
A equipe levou 50 minutos para abrir cada parcela, e 1h30 na medição
interna, informou Higuchi, que trabalha pela segunda vez em Rondônia e atua há
15 anos com inventários florestais no Acre, Amazonas e Roraima.
“A floresta é heterogênea, daí a necessidade e a importância da abertura
de trilhas”, disse o coordenador.
“O privilégio dessas 95 famílias, aproximadamente mil pessoas, de
morarem na região significa dizer que conhecem cada palmo desse chão”, lembrou
o coordenador de Unidades de Conservação, Fábio França. Dessa maneira, ele
considera que esse trabalho no âmbito do maior projeto de crédito de carbono em
reservas extrativistas no País “trabalhará com dados precisos e imprescindíveis
à Sedam”.
O engenheiro florestal Higuchi explicou cada serviço validado pela
equipe: “Os responsáveis pela dendrologia estudaram a caracterização
morfológica, a semi-botânica, flores e frutos das árvores, constatando que nem
toda espécie floresce no mesmo período do ano”.
Já a turma encarregada de observar árvores caídas também fizeram sua
medição total, o que servirá para o inventário determinar a altura dominante do
sítio. “E eles fizeram também a cubagem das árvores, dimensionando o volume do
tronco, resultando a avaliação do volume de árvores em pé e no cálculo da
biomassa de carbono”, explicou o coordenador da equipe.
Árvores frondosas e plantas que originam remédios naturais são riquezas
no inventário feito pela Sedam
A Resex tem angelim, castanheira, copaíba, cerejeira, breuzinho, cipós
diversos, mulateiro, sangue de dragão, e seringueira nativa. À beira das
estradas internas ainda existem árvores de mogno (Swietenia macrophylla). “Essa
riqueza em cerejeira e mogno é importante, ela não existe, por exemplo, no
Amazonas”, observou.
A floresta do Cautário é ombrófila densa. Segundo a Empresa Brasileira
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), ela é também conhecida por floresta pluvial
tropical (Floresta Amazônica e Floresta Atlântica), cuja formação está
condicionada à ocorrência de temperaturas elevadas, em média 25ºC, e altas
precipitações bem distribuídas durante o ano; no período de estiagem essas
chuvas variam de zero a 60 dias.
Originário da Amazônia, o mogno já começou a desaparecer também no
Estado de Rondônia, levado por madeireiros, na maioria das vezes,
clandestinamente. Comum também nos estados de Goiás, Maranhão, Mato Grosso,
Pará e Tocantins, ele também ainda é encontrado em florestas no Peru e no
México.
Cresce rápido, podendo alcançar quatro metros aos dois anos de idade. A
largura do tronco varia entre 50 e 80 cm de diâmetro. Floresce entre os meses
de novembro e janeiro; seus frutos amadurecem no mês de setembro e se prolongam
até meados de novembro. A árvore é ornamental quando usada na arborização de
parques e jardins.
Já o breuzinho, segundo estudos, existe em dezenas de espécies de
árvores da família Burseraceas. Elas produzem qualidades diferentes de
breuzinho ou breu, entretanto, somente uma espécie que produz a resina
conhecida por breu branco, é a mais aromática e com maior quantidade de
propriedades medicinais que as outras. O Departamento de Química da Unir
começou a pesquisá-lo no início dos anos 2000, com apoio da Universidade
Federal do Ceará.
Por sua vez, o mulateiro sofreu grande devastação em terras de
mineradoras no interior de Porto Velho e da região onde surgiu o município de
Itapuã do Oeste, a cem quilômetros da Capital. Tratores e máquinas usados
na lavra da cassiterita (minério de estanho) destruíram milhares dessas
árvores. O mulateiro, retilíneo, ramificado apenas na ponta, e esguio, de 30-40
cm de diâmetro, tem casca fina e quando industrializada serve para regeneração
de pele de pessoas vítimas de queimaduras de terceiro grau.
Quando nova, a árvore é esverdeada, tornando-se marrom até mesmo
castanho-escura. Descama anualmente em longas tiras, deixando exposta a camada
interna avermelhada. O aspecto liso do tronco dá a impressão de ter sido
envernizado.
Predominam ali os latossolos vermelho distroférricos (latossolo roxo
distrófico) e excepcionalmente os latossolos vermelho eutroférricos (latossolo
roxo eutrófico), originados de granitos e gnaisses, além de arenitos com
derrames vulcânicos de vários períodos geológicos.
“Já esperávamos encontrar a Resex do Rio Cautário
assim; o terreno aqui é plano, sem aclives e declives, facilitando o nosso
trabalho”, considerou Higuchi.
O inventário ensinou jovens extrativistas a lidar melhor com a Resex.
Henrique Masceno, 28, nascido em Ji-Paraná, um dos moradores da Comunidade
Águas Claras, usou o GPS. “Separo a castanha dos ouriços e seco no barracão”,
explicou. Esse trabalho dura 40 dias e é feito por ele entre janeiro e
fevereiro de cada ano. Outros demoram mais tempo, ele revelou.
Acompanhando o último dia de trabalho para o inventário, o engenheiro
florestal Miguel Milano, de uma empresa parceira da Sedam no projeto de crédito
de carbono, elogiou “quem conserva e nunca saiu da região”.
Respeito à natureza: a equipe faz a oração do Pai Nosso antes de iniciar
o último dia do trabalho na floresta do Rio Cautário
Ele sugeriu: “O lucro do látex e da castanha pode sim ficar na
comunidade, evitando que pare nas mãos de atravessadores; a copaíba também, e
assim poderemos firmar compromissos com outros ativos”.
Faz parte dos planos de Milano promover também investimentos em estudos
de crianças da reserva, para que adquiram consciência em relação à
autossustentabilidade. Lembrou o engenheiro que o extrativismo da castanha e da
seringueira é praticado em várias gerações pelas famílias da Resex, cujos
saberes são transmitidos de pai para filho.
A coleta da seringa, basicamente masculina, assim aconteceu longos anos
por conta dos “mais velhos”, por causa da paralisação das atividades dos
seringais velhos, em função da baixa atratividade econômica. Situação que tende
agora a melhorar, graças aos investimentos do governo estadual.
O rio Cautário é o principal curso d’água da Resex |
O rio Cautário é o principal curso d’água da Resex e tem grande
protagonismo no cotidiano das comunidades extrativistas. Praticamente tudo está
relacionado ao rio e a adaptação aos ciclos estacionais das cheias e vazantes é
parte da realidade das populações ribeirinhas.
Além das planícies, esse sistema fluvial é também composto por diques
marginais de pequeno desnível, lagoas marginais, baías, paranás, furos, barras
de canal e pontal, geralmente formadas por sedimentos arenosos e ilhas ocupadas
por florestas e formações pioneiras. No geral, esse rio possui
um desnível topográfico de mais de 60 metros em sua passagem pela área de
estudo, variando desde os 200 e poucos metros, ao atravessar a Serra dos
Uopianes, até aproximadamente os 135 metros, em sua foz no rio Guaporé.
Nesse intervalo espacial, o Cautário apresenta diferentes padrões de
escoamento, desníveis topográficos mais acentuados ou mais amenos e diferentes
densidades de drenagem, velocidade das águas e ambientes de sedimentação.
[Dados do ICMBio no Plano de Manejo da Resex].
Fonte
Texto: Montezuma Cruz
Fotos: Frank Néry
Secom - Governo de Rondônia